No final doa anos 90, mais precisamente em 1997, o governo do Estado de São Paulo, junto à Secretaria Estadual de Educação, lançou uma coletânea de belas histórias de professores. Era produto de um desafio lançado à ESCOLA PÚBLICA, na época.
Os professores deram a resposta, mostrando a qualidade do trabalho das salas de aula, do seu dia-a-dia de mestres e que, apesar de todos os percalços é sempre possível fazer a diferença.
Muitos deles ainda permanecem em salas de aulas, outros já se aposentaram, mas suas histórias se eternizam, ecoam pelos cantos e pelos corações daqueles que sabem que EDUCAR é mais que uma profissão.
Um volume de AMOR, CARINHO, AFEIÇÃO pela ARTE da EDUCAÇÃO.
Hoje deixo aqui a história de Ana Maria da Costa - professora, nesta data, da EEPSG "Anhanguera" - Capital
UM PÉ NA ÁFRICA E O CORAÇÃO TAMBÉM
A sala de aula era clara. Quatro janelas grandes, sujas, com alguns vidros quebrados. Lousa bem colocada, escrivaninha normal, desas que não cabe nada daquele monte que a gente carrega. Poderia ser uma escola pública qualquer de São Paulo ou de outro lugar, não fosse pelos alunos que me olhavam. A grande maioria negra; dos tons de pele mais variados do negro-negro ao achocolatado e enormes olhos atentos. O restante dos alunos era descendente de indianos ou mulatos. Todos atentos.
Fazia mais ou menos uns quatro meses que eu estava em Maputo, capital de Moçambique. Por algum tempo, andei vazia e estrangeira pela minha terra. Para encontrar algum sentido, mudei de país.
Sonhei, sonhava e sonhava com a África, com suas Savanas e, mais ainda, com a utopia de um povo que se reconstrói.
Aproximadamente uns quarenta olhos me olhavam quando entrei na sala de aula; maiores do que o normal, curiosos e observadores. Negros olhos da negra África. Misteriosos. Perscrutaram-me.
Estranhei a organização impecável dos alunos e o silêncio pairante.
Desde que assumira as aulas de Língua Portuguesa dos alunos de uma escola técnica do segundo grau em Maputo incomodava-me desenvolver o conteúdo do planejamento fornecido pelo outro professor e avalizado pelo Ministério da Educação. O conteúdo era idêntico ao programa brasileiro para o segundo grau na área de Língua Portuguesa: teoria da comunicação, signos linguísticos, funções da linguagem e por aí afora. Genialíssimo processo da abstração para quem tem o domínio da língua.
Eu percebia que, durante as exposições das aulas, a rapaziada olhava-me com simpatia (eu os fazia rir), mas aquilo que era explicado, desastre! Eles mantinham uma postura corporal estranhamente imóvel, bastante incômoda para mim. Com o tempo aprendi ser uma forma de resistência.
Ao longo das semanas de trabalho, passados o primeiro impacto e a primeira estranheza quanto à língua, posturas, atitudes, problemas na comunicação, descobrimo-nos como amigos curiosos. Que delícia!
Conversávamos sobre nossas culturas. Senti liberdade para discutir com uma turma do curso de Mecânica, por quem eu sentia muito carinho, o problema do conteúdo da Língua Portuguesa.
Eu argumentava sobre uns problemas que dificultavam o processo ensino-aprendizagem; todos sentiam uma imensa dificuldade para compreender os conceitos trabalhados ou, pior, não entendiam nada. Alguns alunos, em função de term excelente memória (relacionada a tradição oral), reproduziam falas inteiras, sem compreensão alguma. O problema maior, no entanto, era o fato de a maioria dos alunos não dominar a língua portuguesa. O léxico era pobre e muitos alunos simplesmente não falavam. Sorriam somente.
Tivemos conversas sobre isto; conversas sérias e frequentes. Os que eram desinibidos e mais falantes argumentavam sobre a necessidade de eu trabalhar o programa estabelecido. Eu dizia que nós podíamos mudá-lo, buscando uma maneira de trabalhar a língua que fosse mais rica, dinâmica e participativa. E vivia um tanto quanto desanimada e meio pesada. Mal sabia que aquilo que vinha acontecendo já fazia parte de um processo.
Nesta manhã de céu azul, quando entrei em sala sob os olhares atentos de meus alunos, fui surpreendida. Talvez tenha ganho um desses presentes que só professor entende.
O mais velho dos mais velhos dos alunos daquela classe pediu licença para falar. Disse-me: "A senhora professora está a a olhar a classe organizada. Cada fileira de aluno tem um representante, que é o mais velho desse grupo e irá organizar a equipe. Eu sou o representante de todos porque sou o mais velho." Prosseguiu: "Sabe, senhora professora, temos estado preocupados com tudo o que a senhora vem dizendo sobre as aulas de Língua Portuguesa. Faz uma semana que estamos a conversar sobre os seus argumentos. Queremos saber qual a sua proposta. Ouviremos. Se gostarmos aceitaremos mudar".
Imaginem o meu espanto. Maravilhosa, encantadora, surpreendente e sábia cultura desse negro povo. Por dentro, eu não tinha sangue, tinha a corredeira de um rio nas veias e um nó na garganta que me deixou muda por longos segundos. Quantos mil pensamentos tive: a compreensão do que acontecia, a emoção e o respeito por todos aqueles olhos luminosos...
Amei-os. Juntos aprendemos a construir nossas aulas.
Parece pouco?
Este é um texto que nos mostra o quanto muitos EDUCADORES podem fazer a diferença e que o professor nada mais é do que um grande mediador, mas que para acontecer esta mediação tem que existir senso, consenso e muita, mais muita sabedoria.
Boa leitura a todos.
Abraços
Malu
Que história linda, Malu. Mostra bem a diferença que faz a figura de um REAL professor.
ResponderExcluirObrigada por compartilhar.
beijos
Que lição fascinante, estou maravilhada.
ResponderExcluirSempre um enorme prazer passar por este espaço que tenho um carinho especial. Beijinhos, minha amiga!!
ResponderExcluirBom dia amiga!
ResponderExcluirEu como professora de Língua Portuguesa a 32 anos,sei bem o que é isso,com certeza nos realizamos quando amamos o que fazemos.
Grande abraço
se cuida
vamos atrás da sabedoria!
ResponderExcluirOlá amiga!
ResponderExcluirMaravilhoso e rico texto!
Tudo que fazemos há de ser com amor para que possa florescer...
Beijos de Luz e Paz
.
ResponderExcluirA história é fantástica e por mais
que a conheçamos, sempre nos causa
espanto. O professor deveria ter o
seu trabalho reconhecido em todos
as aspectos, haja vista que qual-
quer profissional passou por sua
sala de aula e através dos seus en-
sinos se tornaram o que são hoje.
Existem exceções, é claro, mas gos-
to de falar de regra geral.
-Mestre, tiro para o seu empenho e
teimosia, o meu chapéu.
silvioafonso
.
passando para desejar uma semana abençoada e gradecer sua visita ceci.
ResponderExcluirOi Malu, vim agradecer o teu comentário. Obrigada querida blogueira. Venha sempre que puder. Beijos.
ResponderExcluirOlá Malu, primeiramente vim agradecer teu comentário no meu blog, como também apreciar seu belísssimo texto tão realista. Nota-se o teu desempenho como professora. Quando amamos e dedicamos ao que fazemos com apreço, é gratificante. Abraços.
ResponderExcluirestou passando para deixar um abraço ceci...
ResponderExcluirOla Malu, obrigada pela visita, vamos aguardar a melhora da querina Dona Sinha, qualquer novidade eu te aviso. ok obrigada por me seguir ja estou seguindo o este blog e visitarei os outros.
ResponderExcluirBeijos Raios de Alegria Artesanatos
Oi Malu, um belo blog este teu, obrigado pela visita, e lindo post, uma lição.
ResponderExcluirAbraços, boa tarde, Mauro
FUI PROFESSORA POR ALGUM TEMPO, E TIVE O PRAZER DE ACOMPANHAR ALGUMAS PESSOAS NO CAMINHO DO ENSINAMENTO, E FOI UMA AVENTURA MARAVILHOSA
ResponderExcluirBACI
¡Hola Malu!
ResponderExcluirSolo desearte un Feliz fin de Semana y un abrazo.
Flor vim agradecer pela visita no Mais Estilosa.
ResponderExcluirVolte sempre viu?!
http://www.maisestilosa.com
Oi Malu, ainda não conhecia esse blog, excelente, amei, aborda assunto de máximo interesse na sociedade atual !
ResponderExcluirBeijo no ♥!
Tenha um fim de semana de sorridentes alegrias !
http://casascoisaseoutros.blogspot.com.br/
“Não sacrifique o dia de hoje pelo de amanhã.
Se você se sente infeliz agora, tome alguma providência
agora, pois só na seqüência dos agoras é que você existe.”
Clarice Lispector
Tudo flui quando amamos nossa profissão. Um verdadeiro professor pode mudar realidades.
ResponderExcluirBjos!
amonailart.blogspot.com
*Malu, sou professora de uma escola pública do Estado de
ResponderExcluirSP há mais de 20 anos e a frase que mais pronuncio nos
últimos 02 anos é : "QUERO APOSENTAR !!! "
*Malu, essa professora teve ALUNOS, isto é, jovens
que queriam aprender, estudar e por isso, o silêncio se
fazia presente na sala-de-aula e eles eram ATENTOS em
relação à ela !!! Taí O SEGREDO para a Educação no
Brasil voltar a existir : ter olhos atentos e
silenciosos diante da pessoa, do profissional que se
denomina PROFESSOR !!! :))
*Minha querida amiguinha Malu, sigo este teu
blog também !!! :) Se puderes, visite um blog meu que
estou tornando-o público :
www.mesadeestudo.blogspot.com
Deixe um comentário teu lá ! Ficarei FELIZ por saber
que você esteve lá !!! :)
Oi Malu
ResponderExcluirDe alguns professôres tenho muiiiitas lembraças, algumas assim, assim, como o de Física - no 3º do Científico, que foi um traste e que era um baita preguiçoso, que não dava aula, ficava sentado lá na classe em frente aos alunos .... MAS tive outros maravilhosos a quem agradeço de ♥
Bj♥s mil pra ti e muiiiito agradecida por tua visita e teu comentário carinhoso em meu 'bloguito'
Obrigada por tudo, viu?
+ Jinh♥s
.
ResponderExcluirPor que o dia dos pais
deixa o homem mais ho-
mem e a mulher mais do-
ce?
Talvez a resposta este-
ja no meu blog.
silvioafonso
Beijos,
Palhaço Poeta
.
E como o professor não é bem reconhecido (nem remunerado) por aqui. Uma das profissões mais necessárias, e que parece que tá começando a se extinguir :S
ResponderExcluirhey segue de volta e deixa um comment?
www.diademegalomania.blogspot.com
valeeeu
Querida amiga
ResponderExcluirQuando as palavras
encontram sentimentos
que fazem com que elas
encontrem seus sentidos,
nossa vida se enfeita
com as cores da esperança.
Obrigado por sua amizade.
Aluísio Cavalcante Jr.
claro exemplo de pessoa que ama o que faz...
ResponderExcluirqueria continuar lendo, sabendo mais detalhes desta história, rs
ResponderExcluirFormidável experiência, e que respeito os alunos demonstraram para com a professora e ela para com eles.
beijo Malu.
Hoje resolvi viajar por outro dos seus blogues, e ainda bem que o fiz. É que a escola é uma questão que me diz muito, faz parte do meu quotidiano.
ResponderExcluirGostei do testemunho. Prometo vir aqui mais vezes.
Beijo :)
Boa tarde Maluzinha! Li o texto até o final ansiosa para saber o resultado...e feliz por saber do entendimento entre alunos e a professora...mas afinal, mesmo já aposentada, e sendo ptofessora de matemática, a emoção foi a mesma, o fato é ensinar e como ensinar e me senti a própria professora do texto. Gostei quando ela disse "Por dentro, eu não tinha sangue, tinha a corredeira de um rio nas veias e um nó na garganta que me deixou muda por longos segundos." É bem assim a emoção que nos passa, quando enfim, descobrimos como lidar com uma sala, que é toda nossa e que de início, não descobrimos o segredo de levá-la adiante, enfim, quando conseguimos, nos sentimos assim. Gostei muito poder ler esse texto. Uma bela tarde. Um grande abraço.
ResponderExcluirUma bela lição!
ResponderExcluirParabéns!!!!
Muitas beijocas!
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ResponderExcluirDemora pra chegar, mas quando
vem, arraza.
Beijos,
silvioafonso
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Vida, um eterno aprendizado, é bem por aí mesmo! Grata por passar por aqui!
ResponderExcluirAbraços
Oi Malu! obrigada pela visita epor seguir o blog. Parabéns por suas postagens, esse texto nos mostra como é importante um educador que exerce sua profissão com amor e responssabilidade. Um bom educador faz a diferença no ensino. Sucesso pra você minha linda!! Bjuss
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